Gastrite crônica: Helicobacter pylori e gastrite auto-imune.

Gastrite crônica: Helicobacter pylori e gastrite auto-imune.

Dr Fernando Valerio - Blog - Gastrite Cronica
O termo gastrite representa a inflamação da camada interna do estômago, chamada de mucosa. A gastrite crônica representa a inflamação que ocorre por períodos mais longos ou em episódios repetitivos. A gastrite crônica é muito vista pelos Gastroenterologistas, visto que a endoscopia digestiva alta (principal método diagnóstico) é um exame realizado com muita frequência. Este tipo de gastrite é geralmente classificada de acordo com a sua causa em infecciosa (bacteriana e parasitária), autoimune, alérgica, medicamentosa (anti-inflamatórios) e dietética (álcool). O objetivo deste artigo é discutir as principais causas de gastrite crônica, os sintomas mais comuns e os tratamentos aplicados.

I) Gastrite crônica e Helicobacter pylori
A infecção pelo Helicobacter pylori (H. Pylori) é a principal causa de gastrite crônica no Mundo. Esta bactéria foi descoberta em 1982 pelos australianos Warren e Marshall (vencedores do Prêmio Nobel) e coloniza o estômago de aproximadamente metade da população Mundial. Todas as pessoas infectadas pela bactéria H. pylori apresentam algum grau de gastrite crônica, sendo que o grau da inflamação da mucosa será o resultado da interação entre a virulência (agressividade) da bactéria, a genética do hospedeiro e a fatores ambientais. Sabe-se que a inflamação crônica da parte central do estômago (chamada de corpo), a gastrite atrófica severa e a metaplasia intestinal (substituição da mucosa gástrica pela intestinal devido à inflamação) podem estar relacionadas ao câncer de estômago.
O reservatório exclusivo do Helicobacter pylori é o estômago humano. A prevalência da infecção depende do aspecto sócio-econômico da região, visto que a transmissibilidade da bactéria está relacionada à falta de saneamento e condições de higiene. Por isso, na América do Norte a prevalência é de 8% da população, enquanto na América do Sul, é de 78%. A bactéria pode ser encontrada nas fezes e na cavidade oral de pessoas infectadas, mas só coloniza e persiste com o tempo na mucosa do estômago. Apesar da infecção ser muito prevalente em adultos, com o uso de antibióticos para a erradicação do H. pylori a e melhora das condições de higiene em países industrializados, a prevalência da infecção por esta bactéria vem caindo em crianças e jovens.
Para o diagnóstico da infecção pelo Helicobacter pylori testes invasivos e não invasivos estão disponíveis na prática clínica. Os métodos invasivos são decorrentes de biópsia realizada em endoscopias digestivas altas e são representados pela cultura, teste da uréase e detecção molecular. Os diagnósticos não invasivos são realizados através de testes respiratórios, pesquisa nas fezes e sorologia (sangue). Um problema comum relacionado aos métodos diagnósticos é que o uso de medicamentos que diminuem a acidez do estômago e que são muito usados por pacientes com sintomas gástricos diminuem a densidade da população da bactéria, dificultando assim o diagnóstico. Outra limitação ocorre com o exame de sangue, que não consegue demonstrar se a infecção é atual ou se já foi erradicada.
O tratamento atual para a erradicação do Helicobacter pylori consiste no uso de antibióticos e medicamentos que diminuam a produção de ácido pelo estômago. Os antibióticos mais comuns são a claritromicina, amoxacilina e metronidazol. No caso de tratamento ineficaz, outros antibióticos podem ser utilizados.

II) Gastrite Autoimune
A gastrite autoimune é outra causa de inflamação crônica do estômago, e refere-se à agressão do estômago pelo sistema imunológico do próprio paciente. O termo gastrite autoimune refere-se a uma variedade de definições como a gastrite atrófica de corpo e a anemia perniciosa. A apresentação clínica pode ser variável, mas em geral ocorre a deficiência de vitamina B12 e anemia perniciosa manifestada. A deficiência de ferro pode ser uma consequência da inflamação da mucosa (gastrite atrófica) que diminui a produção de ácido clorídrico, prejudicando a absorção deste mineral, o que ocorre em 20 a 37% dos casos. Quanto à sua prevalência, como a gastrite autoimune apresenta-se muitas vezes sem sintomas (assintomática), este número é provavelmente subestimado. Um importante aspecto epidemiológico é a frequente associação da gastrite autoimune com outras doenças autoimunes, como o diabetes tipo 1 e as doenças autoimunes da tireoide.
Este mecanismo de autoagressão ocorre devido à produção de anticorpos anti as células produtoras de ácido e de fator intrínseco de absorção de vitamina B12 do estômago. O fator intrínseco é uma substância que facilita a absorção de vitamina B12, que é fundamental para a produção de células vermelhas do sangue. Assim, a carência na absorção da vitamina B12 faz com que a gastrite crônica autoimune possa evoluir com a anemia chamada megaloblástica ou perniciosa. Quanto à evolução da doença, a inflamação crônica da mucosa gástrica geralmente progride para a atrofia gástrica, podendo até mesmo haver a troca do tecido do estômago pelo do intestino, o que se denomina metaplasia. Estas alterações celulares chamam a atenção por poderem se relacionar com o desenvolvimento do câncer de estômago.
O tratamento da gastrite atrófica consiste na suplementação de ferro e vitamina B12 como forma de corrigir a anemia perniciosa, além da realização endoscopias digestivas altas para o acompanhamento do risco de câncer de estômago.

 

Dados do autor:
Dr. Fernando Valério
Gastroenterologista, Nutrólogo e Proctologista
São Paulo, SP
Consultas: particulares e Omint

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Dr. Fernando Valério