Uso de multivitamínicos para a prevenção de doenças e retardamento do envelhecimento: úteis, indiferentes ou perigosos?

Uso de multivitamínicos para a prevenção de doenças e retardamento do envelhecimento: úteis, indiferentes ou perigosos?

Dr Fernando Valerio - Blog -  Uso de multivitamínicos

Atualmente há um número crescente de pessoas que fazem o uso frequente e indiscriminado de multivitamínicos, e este número só cresce. Na maior parte das vezes, o objetivo é que a suplementação vitamínica promova a saúde e  previna o surgimento de doenças crônicas. Nos Estados Unidos, onde o acesso a estes produtos é muito fácil, mais de 50% da população já faz uso regular dos suplementos vitamínicos e de minerais, na maioria das vezes sem orientação médica ou indicação formal. Não é preciso dizer o quanto lucrativo é esta indústria, o que se comprova facilmente quando se pensa que somente os americanos gastaram quase 12 bilhões de dólares no último ano com estes produtos. Uma das razões para isso é acreditar que quanto maior o índice de vitaminas e minerais que apresentamos em nosso corpo, mais protegidos estaremos. Ou seja, se 10 é bom, 100 pode ser ótimo! Outro motivo para a utilização dos suplementos é que temos a sensação de que, independentemente da sua eficácia, mal eles não devem fazer. Será?

Inúmeros estudos foram publicados a respeito do uso de suplementos vitamínicos e de minerais para a prevenção de câncer e de doenças cardiovasculares em pessoas sem qualquer deficiência nutricional, analisando os benefícios e efeitos colaterais. Os resultados são semelhantes em todos eles, onde não se evidenciou qualquer benefício na diminuição da incidência do câncer e das doenças cardiovasculares nos indivíduos que faziam uso crônico de multivitamínicos. Mas se as vitaminas apresentam funções relevantes e já descritas, por que não potencializariam o seu efeito quando ingeridas em maiores quantidades. Uma das melhores justificativas é acreditar que os nutrientes funcionam de forma mais fisiológica quando agem em conjunto com outros nutrientes contidos nos alimentos. Por isso, isolar uma vitamina e colocá-la em uma cápsula pode não ser tão efetivo quanto ingerir os alimentos que contenham este micronutriente em boa quantidade. Particularmente, eu penso que a alimentação real é e sempre será mais indicada, e que isolar as vitaminas diminui o seu potencial por tirá-las do contexto natural. Além disso, atividades biológicas no nosso corpo podem alterar as características das vitaminas quando estas são administradas em forma de suplementos e não dentro dos alimentos que as continham.

Um outro aspecto discutido em relação ao uso de multivitamínicos foi analisar se eles teriam algum efeito protetor contra o declínio cognitivo da idade mais avançada. Para isto, um estudo publicado na revista Annals of Internal Medicine analisou a capacidade cognitiva de 5947 médicos do sexo masculino com mais de 65 anos e que faziam uso de suplementos vitamínicos diariamente. Após 12 anos de estudo, os resultados não mostraram melhora da capacidade cognitiva e da memória verbal em comparação com o grupo que não fez uso dos multivitamínicos. Outros estudos utilizaram a suplementação com vitaminas do Complexo B, vitaminas C e E, além de gorduras ômega-3 em pacientes com doenças demenciais. Não houve qualquer melhora. A conclusão de todos os estudos sérios sobre o tema é de que nenhum suplementos vitamínico ou mineral trouxe qualquer benefício quando se pensa na nossa atividade cognitiva.

E se você tivesse apresentado um infarto agudo do miocárdio e agora decidisse por uma vida mais saudável, o que seria ótimo, será que os multivitamínicos lhe ajudariam? Não! Os estudos não mostram a redução da incidência de novos eventos cardiovasculares quando se faz suplementação de vitaminas em quem não tem a sua deficiência. Portanto, a melhor maneira de prevenir novos problemas cardíacas é  manter um controle adequado do colesterol, triglicérides, diabetes e hipertensão arterial sistêmica. Para isto, recomenda-se uma dieta adequada, pobre em gorduras saturadas e trans, dieta rica em fibras, atividade física regular e perda de peso.

Como já se percebeu, a utilização de multivitamínicos em pessoas sem a carência de determinada vitamina ou mineral não é recomendada, visto que não há comprovação prática e científica para tal suplementação. Mas há algo mais grave relacionado ao uso destes suplementos, já que eles podem ser deletérios à saúde. Nós temos basicamente dois tipos de vitaminas, as hidrossolúveis e as lipossolúveis. No caso das hidrossolúveis, como se diluem bem em água, quando ingeridas em excesso são eliminadas através da urina. O problema maior ocorre nas vitaminas lipossolúveis, que são solúveis apenas em gorduras. Estas últimas necessitam de maior esforço para serem eliminadas do nosso organismo e por isso se acumulam com maior facilidade. Como ocorre um depósito aumentado destas vitaminas, há o risco de alguma lesão tecidual ou precipitação de alguma doença. Como exemplo, os beta-carotenos, a vitamina E e a vitamina A em excesso podem causar alguns distúrbios à saúde. Os suplementos de beta-carotenos estão associados ao desenvolvimento de câncer de pulmão nas pessoas com fatores de risco para este câncer. A hipervitaminose E também é considerada cardiotóxica. O cálcio, quando administrado em excesso e na carência de vitamina D, se relaciona ao aumento de risco cardiovascular. Alguns minerais competem entre si, e quando um deles é administrado em excesso, o outro pode se tornar deficiente.

Em conclusão, “suficiente é o suficiente”! Não há recomendação médica que comprove a suplementação de multivitamínicos e minerais para a promoção da saúde e prevenção de doenças. A reposição deste micronutrientes deve ocorrer apenas em pessoas com deficiências nutricionais específicas, como a carência de determinada vitamina ou mineral.

Postado por:

Dr. Fernando Valério